A respeitada revista Economist destacou em outubro de 2016 a possível revolução no tratamento da depressão relacionada com o uso da cetamina para esta indicação. Leia a tradução livre. Ao final, o link. Uma nova geração de drogas pode mudar a forma como a depressão é tratada Começou como LY110141. Seu inventor, Eli Lilly, não sabia o que fazer com ele. Eventualmente, a empresa descobriu que parecia tornar as pessoas deprimidas mais felizes. Assim, com muita publicidade e “branding” inteligente, o primeiro inibidor seletivo da recaptação de serotonina nasceu. Ele transformaria o tratamento da depressão e se tornaria o antidepressivo mais amplamente prescrito na história. Alguns usuários o descreveram como “sol engarrafado”. Alcançou o pico de vendas anuais (em 1998) de US $ 3 bilhões e, na última contagem, foi usado por 54 milhões de pessoas em 90 países. E, ao longo do caminho, incorporou na consciência pública uma ideia particular sobre como a depressão funciona – que é causada por um desequilíbrio químico no cérebro, que a droga corrige. Infelizmente, essa ideia parece ser apenas parte da história. Na ciência é bom ter uma hipótese para enquadrar o pensamento. O termo “desequilíbrio químico” é exatamente isso. É a simplificação leiga da hipótese da monoamina, que tem sido a explicação predominante para a depressão há quase 50 anos. Monoaminas são uma classe de substâncias químicas que muitas vezes agem como moléculas-mensageiro (conhecidas tecnicamente como neurotransmissores) entre as células nervosas no cérebro. Muitas drogas antidepressivas aumentam o nível de uma ou outra destas moléculas. No caso deste antidepressivo, a monoamina em questão é serotonina. A hipótese monoaminérgica, no entanto, está sob ataque. Uma objeção de longa data é que, embora estas drogas elevem rapidamente os níveis de monoaminas, os sintomas da depressão podem levar semanas ou mesmo meses para diminuir – se, de fato, diminuem, pois muitos pacientes não respondem aos medicamentos. Agora, uma segunda objeção surgiu. Esta é a descoberta que a cetamina, uma droga usada por muito tempo como um anestésico e também popular para uso recreativo, atua como um antidepressivo de ação rápida. O modo de ação da cetamina não é primariamente sobre as monoaminas, então a corrida é para descobrir como ela funciona para projetar uma nova classe de antidepressivos. Esta é uma mudança de direção tão radical que alguns pensam que uma revolução na psiquiatria se anuncia. A cetamina funciona para 75% dos pacientes que têm sido resistentes a outras formas de tratamento. Além disso, ela funciona em horas, às vezes até minutos, e seus efeitos duram várias semanas. Uma dose única pode reduzir pensamentos de suicídio. Como resultado, embora não tenha sido formalmente aprovada para uso em depressão, é amplamente prescrito “off label“(literalmente fora da bula), e clínicas surgiram por todos os Estados Unidos da América, em particular, para oferecer infusões da droga (que deve ser tomada por via intravenosa). Relatos de casos sugerem que este procedimento já salvou muitas vidas. A ascensão da cetamina foi gradual. A descoberta da sua eficácia contra a depressão aconteceu há uma década. A realização de ensaios clínicos com medicamentos cujas patentes tenham expirado como a cetamina não é uma prioridade para as empresas farmacêuticas, que geralmente preferem testar novas moléculas cujas patentes elas possuem – e sem tais ensaios, a aprovação formal para um novo uso não pode ser dada. Agora, porém, novos tratamentos relacionados à cetamina estão surgindo. Um deles é a escetamina. A cetamina normal é uma mistura de duas moléculas que são imagens espelhadas umas das outras. Escetamina é apenas um destes “isómeros ópticos”. A Johnson & Johnson, uma grande companhia farmacêutica americana que a está desenvolvendo para uso, espera que ela tenha os mesmos efeitos positivos que a mistura isomérica não triada, mas sem efeitos colaterais como alucinações, tonturas e “dissociação” – um sentimento de estar acordado, mas desapegado de seu ambiente. Ao alterar a sua formulação para que possa ser administrada sob a forma de um “spray” nasal, a firma torna a escetamina mais fácil de usar do que a cetamina mista isomericamente e cria algo patenteável. Evidências preliminares sugerem que a escetamina realmente funciona e a empresa está buscando aprovação para que ela seja usada para tratar duas condições: transtorno depressivo maior com risco iminente de suicídio e depressão resistente ao tratamento. Outras empresas, porém, estão adotando uma abordagem diferente. Elas estão estudando o mecanismo de ação da cetamina e tentando imitar o modo como ela funciona. Muitas pessoas pensam que a cetamina afeta a ação de um neurotransmissor comum chamado glutamato, bloqueando receptores para esta molécula. Uma hipótese é que ela interage com um receptor de glutamato chamado NMDA que nunca tinha sido previamente pensado estar envolvido na depressão. Várias empresas estão, portanto, procurando imitar o efeito da cetamina, visando ao receptor NMDA. Uma delas é a Allergan, uma empresa irlandesa que no ano passado pagou US $ 560 milhões para comprar a Naurex, uma empresa de biotecnologia americana cujo medicamento rapastinel, bloqueador de NMDA, é destinado a tratamento intravenoso uma vez por semana. Evidências de um ensaio inicial mostra que o Rapastinel é bem tolerado, não induz alucinações e parece funcionar rapidamente. A Allergan planeja iniciar testes mais extensos ainda este ano. A Allergan não está sozinha no seu interesse na via NMDA. Outras empresas que trabalham em moléculas que interagem com este receptor, ou com um tipo especial de receptor NMDA chamado NR2B, incluem a AstraZeneca, a Avanir Pharmaceuticals e a Cerecor. Seria um erro, porém, pensar que a ciência chegou a uma conclusão nítida sobre como a depressão age no cérebro. Uma surpresa veio no início deste ano com o trabalho publicado por Carlos Zarate do Instituto Nacional de Saúde Mental dos Estados Unidos, que é um pioneiro no campo. Este estudo sugere que, em ratinhos pelo menos, a cetamina não afeta diretamente o receptor NMDA, mas sim outro receptor de glutamato. Esta descoberta não interessa à Johnson & Johnson, porque a escetamina imita os efeitos da cetamina normal. Mas pode significar que aqueles que estão apostando na via NMDA com outras moléculas estão indo pelo caminho errado. Quanto aos detalhes do estudo do Dr. Zarate, Husseini Manji, o chefe de neurociência da Johnson & Johnson, diz que é possível que este trabalho tenha identificado uma forma adicional de gerar efeitos antidepressivos. Mesmo que seja descoberta outra via de ação da cetamina isso não impede que ela funcione também via NMDA. Armin Szegedi, que dirige o desenvolvimento clínico da droga rapastinel da Allergan, traz o mesmo argumento. Ele explica que todos os receptores de glutamato parecem interagir uns com os outros, agindo como um sistema complicado. O tempo dirá quem está correto, mas tais minúcias são menos importantes do que qualquer uma dessas novas abordagens funcionarem. Muitas drogas, para muitas indicações, funcionam bem, embora ninguém saiba exatamente como. O ponto importante, porém, é que a cetamina abriu uma nova linha de ataque contra uma doença horrível. Link: http://www.economist.com/news/science-and-technology/21708655-new-generation-drugs-could-change-way-depression-treated-novel-drugs