Recomendo o vídeo abaixo para os que se interessam sobre as bases neurobiológicas da depressão e do seu tratamento.
Até hoje, muitas pessoas acreditam que a depressão está relacionada apenas com uma falta de serotonina no cérebro.
Inclusive, muitos pacientes chegam a falar isso durante a consulta. Muitas vezes eles leram isso na internet.
Esta é uma hipótese antiga sobre a causa da depressão. Ela é baseada no fato de que a maioria dos antidepressivos aumentam a disponibilidade de serotonina nas sinapses cerebrais.
Se este fosse o caso, a depressão seria comparável a uma disfunção endócrina: tal órgão não está produzindo quantidade certa de tal hormônio, então apenas devemos repor esta substância que está em baixos níveis. O hipotireoidismo funciona assim por exemplo.
Seria bem mais simples. Infelizmente, hoje sabemos que não é este o caso.
Na verdade, as alterações neurobiológicas ligadas a depressão são bem mais complexas do que isso. Da mesma forma, o mecanismo de ação dos antidepressivos também.
Então, gostei deste vídeo pois ele mostra a complexidade da neurobiologia e do tratamento da depressão.
Gostei ainda mais porque ele cita um novo tratamento para depressão que pode representar uma mudança de paradigma na psiquiatria: o tratamento com cetamina que é rapidamente eficaz em 70% dos casos que não respondem a medicação convencional. Este medicamento atua principalmente num receptor de glutamato e não de serotonina.
De fato, este vídeo foi produzido pela Jansen que está investindo pesado no desenvolvimento e pesquisa da cetamina por via intra nasal para depressão, conforme este link.
Se você quiser saber mais sobre este avanço no tratamento da depressão, basta inserir seu nome e seu e-mail ao lado ou clicar aqui.
O vídeo é em inglês. Para legendar clique no botão “cc” e depois no botão “subtitles” e procure a opção “português”. Esta legenda ajuda, mas há muitos erros.
Então, fiz a transcrição abaixo. É uma tradução livre para quem tiver dificuldade com o idioma. Os destaques são meus.
“O humor flutua naturalmente e todo mundo experimenta altos e baixos na vida. Em alguns casos mudanças de humor de longa duração podem se tornar debilitantes e podem prejudicar a capacidade de alguém de manter um emprego ou manter relacionamentos significativos. Estima-se que cerca de 10 por cento das pessoas vão sofrer de depressão em algum momento de suas vidas. A depressão é um transtorno de humor caracterizado por diversos sintomas como tristeza, angústia, desânimo, cansaço excessivo e perda do interesse em atividades prazerosas(conhecida como anedonia). Muitas pessoas com depressão também sofrem de ansiedade.
Os estudos de neuroimagem revelam que muitos circuitos cerebrais que normalmente regulam o humor estão desregulados na depressão. Localizada no interior do cérebro, a amígdala é altamente responsiva a estímulos salientes tais como recompensas e ameaças potenciais.
Na depressão, a amígdala é hiperativa e responde excessivamente a eventos negativos.
Por sua vez, a amígdala se conecta a um conjunto de regiões cerebrais que dispara a resposta fisiológica e comportamental aos estímulos emocionais. Neste conjunto, estão incluídos o córtex pré-frontal medial, o núcleo accumbens, o hipocampo e a ínsula.
O hipocampo está envolvido na formação da memória e, juntamente com o córtex pré-frontal, é particularmente vulnerável aos efeitos do estresse.
As pessoas depressivas são mais suscetíveis ao estresse, que pode provocar alterações físicas no cérebro, incluindo a atrofia do hipocampo.
Esta e outras mudanças nas pessoas deprimidas podem causar respostas inadequadas para eventos emocionais.
O córtex pré-frontal medial está envolvido na regulação de quão fortemente reagimos a estímulos. Tratamentos com medicamentos antidepressivos, terapia cognitivo-comportamental e eletroconvulsoterapia afetam a estrutura e a função dessas e de outras regiões do cérebro.
Os modelos animais com camundongos são fundamentais para nos ajudar a entender as mudanças celulares e moleculares subjacentes a depressão e a desenvolver melhores tratamentos.
Apesar de ser impossível saber se um camundongo está deprimido, os roedores submetidos a estresse crônico apresentam alguns sintomas semelhantes aos seres humanos deprimidos tais como ansiedade, menos interação social e menos interesse em atividades prazerosas.
Embora nem toda depressão humana seja desencadeada por estresse, esses modelos podem lançar luz sobre a biologia da depressão. Isto é o máximo que os cientistas conseguem obter ao estudar camundongos.
Tal como acontece com os seres humanos, o estresse crônico em camundongos pode levar a atrofia do hipocampo e do córtex pré-frontal. Estudos também demonstraram plasticidade neuronal alterada em várias regiões do cérebro, incluindo o córtex pré-frontal, hipocampo, a amígdala, e nucleus accumbens.
Em um hipocampo saudável, experiências podem levar a mudanças nas conexões entre os neurônios, resultando em aprendizado. Estas alterações são denominadas neuroplasticidade. O estresse crônico pode reduzir essa plasticidade.
Cérebros saudáveis também continuam a produzir novos neurônios em uma parte do hipocampo e esses novos neurônios lentamente modulam e integram os seus circuitos. Eles têm um forte efeito sobre a atividade e o comportamento do hipocampo.
Estes novos neurônios também são afetados pelo estresse. Eles ficam em número reduzido nos cérebros estressados. Estes efeitos podem ser consequência de baixos níveis de proteínas que aumentam o crescimento e a plasticidade neuronal: as neurotrofinas.
A redução da plasticidade pode prejudicar a capacidade do hipocampo de regular adequadamente a resposta ao stress, podendo levar a um ciclo vicioso no qual estresse acarreta mais estresse.
Além disso, podem ocorrer reduções na plasticidade em outras partes do cérebro de forma que o conjunto destas alterações pode contribuir para outros sintomas da depressão como anedonia.
Se as mudanças celulares observadas em camundongos estão envolvidas também na depressão humana ainda não está claro.
A maioria dos antidepressivos disponíveis hoje pode aumentar rapidamente a quantidade de neurotransmissores como serotonina e norepinefrina nas sinapses. No entanto, a melhora dos sintomas em pacientes e em camundongos leva semanas para ocorrer.
Apesar de este atraso não ser totalmente compreendido, o tratamento prolongado com antidepressivos pode reverter algumas das mudanças induzidas pelo estresse crônico aumentando a expressão de neurotrofinas e reiniciando a plasticidade do hipocampo.
Os tratamentos não-químicos para a depressão, incluindo a eletroconvulsoterapia também promovem plasticidade do hipocampo em camundongos.
O tratamento antidepressivo também pode reverter as alterações induzidas pelo estresse em outras áreas do cérebro, incluindo o córtex pré-frontal, circuitos de recompensa e diferentes tratamentos podem atingir diferentes regiões para melhorar os sintomas.
Recentemente, descobriu-se que a droga cetamina tem um rápido efeito antidepressivo tanto em pacientes quantos em roedores. O mecanismo por trás disso é uma área de intensa pesquisa.
A cetamina bloqueia uma transmissão sináptica, de forma a ativar um número de vias de sinalização e a aumentar da expressão de neurotrofinas.
Estas alterações moleculares resultam num aumento da plasticidade no córtex pré-frontal e no hipocampo que contribui para os efeitos terapêuticos da cetamina.
Ao estudar as mudanças no cérebro causadas por estresse crônico e como os antidepressivos como a cetamina agem, os pesquisadores podem encontrar novos alvos para o tratamento e novos medicamentos que atuem mais rápido, de maneira mais específica ou de forma mais eficaz do que os tratamentos atualmente disponíveis.”
Por Dr. Ivan Barenboim, Médico Psiquiatra e Diretor da Clínica OHR Psiquiatria
CRM 155.444 Registro de Qualificação de Especialista 53559